De forma geral, membros do Judiciário, forças de segurança e Ministério Público pedem o veto do PL, pois pode, conforme é destacado, inviabilizar o trabalhos exercidos por estes órgãos.
O Folha conversou com o promotor Francisco Saldanha Lauenstein, que destacou, de início, as dificuldades que serão acrescidas aos trabalhos, principalmente do Ministério Público e do Judiciário, caso o presidente Jair Bolsonaro sancione. "O abuso de autoridade seria uma vontade de exacerbar as funções de um cargo, para prejudicar dolosamente alguém", define o promotor, no entanto, o conceito pode ser difícil de traçar, por se tratarem de conceitos fluídos. "O que por si só, já é uma dificuldade de legislar sobre isso", pontua Lauenstein.
Observa o representante do Ministério Público que após a Operação Lava Jato, um amplo espectro do poder político tem se mobilizado para criar mecanismos que dificultem ou mesmo inviabilizem as investigações. Antes mesmo da Operação Lava Jato, a PEC 37 (que pretendia tornar a investigação privativa da polícia), em 2013, já foi uma tentativa de restrição, aponta o promotor. Foi uma tentativa posterior aos julgamentos relativos ao 'Mensalão', no entanto, as grandes manifestações de junho de 2013 serviram como impedimento para o avanço da proposta. "Desde o início da Operação Lava Jato, de 2016 para cá, se verificam movimentações do Legislativo, de tentar, de forma açodada, como se viu naquele projeto de lei das '10 medidas contra a corrupção', que era de iniciativa popular e a própria equipe da Lava Jato reuniu as assinaturas para apresentá-lo, mas, do dia para noite, virou um projeto de lei de abuso de autoridade", contextualizou Saldanha, complementando que há outros dois projetos de lei com o mesmo tema, sendo o último, proposto pelo senador Randolfe, votado em regime de urgência. "Estamos vivendo uma crise institucional no Brasil. Nós não temos estabilidade para discutir um tema tão delicado como esse, não é o momento", avalia.
Por obvio, Lauenstein pontua que toda a autoridade precisa ser limitada, no caso do Ministério Público, há o Conselho Nacional, composto por advogados, indicações políticas, entre outros, além das próprias corregedorias. "Não vemos notícias de promotores e juízes sendo condenados, mas o que vemos é o contrário: boa parte da classe política corrompida, que agora está tentando reagir".
Caso o presidente sancione o Projeto de Lei sem vetos, o que mais afetará é a apuração dos crimes chamados de "colarinho branco", crimes não violentos, cometidos por políticos ou nos meios empresariais, sendo o mais comum deles a corrupção. "O PL é direcionado para constranger. Uma mordaça. Se esse PL passar, e a tendência é que o presidente vete alguns artigos mais aplicáveis às polícias, terei de pagar advogado para trabalhar", afirma categoricamente Lauenstein, pois terá explicar as ações tomadas nos processos, sob alegação de ter extrapolado ou infringido os direitos do réu, mesmo a prova nos autos sendo farta.
Pelo país, juízes e promotores já se colocaram contra o Projeto de Lei do Abuso de Autoridade.
O Ministério da Justiça, comandado pelo ex-juiz na Operação Lava Jato, Sérgio Moro, já emitiu, através de um documento, que Diversos pontos do projeto de Lei de Abuso de Autoridade podem, mesmo sem intenção, inviabilizar tanto a atividade jurisdicional, do Ministério Público e da polícia, quanto às investigações. O parecer é contrário à aprovação do projeto.
Ao todo, o PL lista 37 ações que poderão ser consideradas abuso de autoridade, quando praticadas com a finalidade específica de prejudicar alguém ou beneficiar a si mesmo ou a terceiro. Entre elas, obter provas por meios ilícitos; executar mandado de busca e apreensão em imóvel, mobilizando veículos, pessoal ou armamento de forma ostensiva, para expor o investigado a vexame; impedir encontro reservado entre um preso e seu advogado; e decretar a condução coercitiva de testemunha ou investigado sem intimação prévia de comparecimento ao juízo.
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