Contraponto: informações sobre pesticidas na água seriam manipuladas; Corsan também emite nota



Na manhã de hoje (24), o Folha publicou reportagem informando sobre a suposta contaminação da água consumida em Dom Pedrito e municípios da região por agroquímicos utilizados em lavouras. Diversos sites especializados e a própria Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan) se manifestaram sobre o assunto. Os dados apresentados seriam manipulados (leia abaixo). Empresas distribuidoras de outros estados também se manifestaram, por nota. 

Informações sobre pesticidas na água seriam manipuladas

Na última semana foi publicada uma reportagem em vários meios de comunicação, sobre contaminação da água de abastecimento por pesticidas. Esta mesma matéria em tom alarmista foi reproduzida e adaptada em centenas de municípios brasileiros. O pânico foi seguido por desmentidos e notas de esclarecimentos das companhias de abastecimento de água em diferentes regiões. 

Ciência e Tecnologia Agro (C & ET Agro) analisou o banco de dados do Ministério da Saúde, denominado SISAGUA e detectou, não apenas divergências entre as informações divulgadas nas reportagens com as existentes no SISAGUA, como também identificou manipulações nas informações. 

Os valores máximos permitidos (VMP) de pesticidas foram estabelecidos por meio da Portaria nº2.914, de 12 de dezembro de 2011, assinada pelo ex-ministro da Saúde Alexandre Padilha (atualmente consolidada na Portaria de Consolidação nº 5, de 28 de setembro de 2017). 

Esta portaria de 2011 atualizou os indicadores que devem ser analisados na água por parte das companhias de abastecimento e determinou os parâmetros de sanidade: microbiológicos, pH, materiais orgânicos e inorgânicos, os valores máximos permitidos para resíduos de desinfetantes e para 27 ingredientes ativos de pesticidas. Dos ingredientes ativos de pesticidas, 11 encontram-se em desuso no Brasil. O monitoramento da presença destes pesticidas na água deve-se à persistência de algumas substâncias no ambiente. 

Problemas identificados nos dados e nas reportagens sobre a suposta contaminação da água de abastecimento 


A metodologia de coleta de água para análise 


Nos resultados do SISAGUA são informados três tipos de coleta de água: a realizada nos pontos de captação (antes de passar pelo tratamento), a coleta na saída do tratamento (logo após ter sido tratada) e a coleta no sistema de distribuição. Os resultados dos três tipos de coleta são inseridos e divulgados conjuntamente. Ocorre que para muitos casos, a depender das características do pesticida e dos procedimentos de tratamento aos quais a água é submetida em cada região, os pesticidas podem ser reduzidos ou eliminados durante o tratamento. Por isso não é correto analisar conjuntamente os resultados de todas as coletas. 

A metodologia analítica para realizar as análises 


A norma do Ministério da Saúde, que estabeleceu os valores máximos permitidos para pesticidas não detalha a metodologia de análise que deve ser utilizada para cada ingrediente ativo, havendo a possibilidade de resultados diversos devido à falta de padronização de metodologias para identificação e quantificação dos pesticidas na água. A falta de padronização na metodologia torna os dados pouco comparáveis e suscetíveis tanto de falso negativos quanto de falsos positivos. Quem de nós nunca recorreu a um segundo exame para confirmar ou descartar o diagnóstico de uma doença? 

Falta de padronização no preenchimento do SISAGUA 


O banco de dados do Ministério da Saúde é preenchido com as informações geradas pelas empresas de abastecimento de água, mas não há uma padronização no preenchimento das informações. Cada notificante decide, por exemplo, o número de zeros que agrega após a vírgula. Para identificar “um micrograma” constam pelo menos seis formas diferentes inseridas no banco de dados: 1; 1,0; 1,00; 1,000; 1,0000 e 1,00000. Verificamos que nas reportagens feitas por pessoas leigas em estatística e não habituadas com este tipo de informação, em muitos casos três zeros após a vírgula foram considerados como “um mil microgramas”, quando na realidade referiam-se a “um micrograma”. 

Como ocorreu a manipulação dos dados nas reportagens 


- As reportagens alardearam a contaminação da água por pesticidas divulgando conjuntamente resultados de amostras coletadas nos pontos de captação antes e após o tratamento, sendo que o tratamento pode reduzir a presença de pesticidas. 

- Os dados utilizados nas reportagens foram gerados durante 4 anos, de 2014 a 2017, no entanto, nos mapas e gráficos das supostas “contaminações” todos os resultados foram inseridos simultaneamente. 

- Os resultados das análises foram comparados à União Europeia que não possui estabelecidos valores máximos por ingrediente ativo para água. A EU determinou que o limite para qualquer contaminante químico em água é o limite de detecção da metodologia analítica de 0,01µg/l. 

- As reportagens não fizeram análise pormenorizada da qualidade das informações inseridas no banco de dados, qualquer informação equivocada foi contabilizada como valor extrapolado. 

Várias reportagens pelo país informavam que dentre outros pesticidas, o glifosato estava associado à contaminação da água. Algumas reportagens chegaram a informar que foram identificadas “oito” amostras acima do valor máximo permitido. 

Para demonstrar a manipulação dos dados, o C&T Agro checou os dados presentes no SISAGUA com os resultados das análises de glifosato. Nos quatro anos de informações existentes no sistema foram realizadas quase 35 mil análises de para detectar a presença de glifosato na água. Somente em cinco amostras houve a detecção do ingrediente ativo acima do valor permitido. Em uma destas amostras a água foi coletada no ponto de captação e as outras quatro precisariam ser checadas quanto à problemas no preenchimento do sistema e na metodologia utilizada.

Corsan também se manifesta 


Sobre matéria publicada nos últimos dias, relacionando a contaminação por agrotóxicos na água tratada, a Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan) informa que a água distribuída à população nos 317 municípios gaúchos atende rigorosamente a legislação brasileira que determina os parâmetros de potabilidade da água para os sistemas de abastecimento. Também são monitorados outros 46 tipos em atendimento à legislação estadual (Portaria 320/2014 da Secretaria da Saúde).

A Corsan ressalta que os dados utilizados na pesquisa apresentada foram retirados do Sisagua (Sistema de Abastecimento de Informação de Vigilância de Qualidade da Água para Consumo Humano) e referem-se a amostras de água bruta (ainda não tratada). A empresa informa que, sempre quando é detectado algum agrotóxico na água bruta, é realizada a análise da água tratada correspondente, não havendo histórico de presença desse agente após o tratamento.

A Corsan e a Associação das Empresas Estaduais de Saneamento (Aesbe) estão pedindo esclarecimentos ao Ministério da Saúde sobre os valores disponibilizados com relação à presença de agrotóxicos na água usada para consumo humano, a fim de não ocorrer interpretação equivocada como ocorreu no material divulgado por veículos de imprensa.

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