Laços partidos


 O final do mês de outubro foi marcado pela dor de uma mãe, não uma mãe nos moldes tradicionais, mas sim, uma mãe do coração. Ela teve a bebê de 3 meses que criava desde os primeiros dias retirada de seus braços, depois que os pais biológicos tiveram a casa incendiada. Nossa reportagem esteve com ela e testemunhou o vazio deixado, no lar e nos corações de todos que ali moram. Rosimere nos narrou emocionada como tudo aconteceu: no começo de agosto um incêndio destruiu a casa de uma família da Rua 14 de Julio. "Naquela noite saimos todos correndo para ver o que estava acontecendo, lá chegando, ouvi as pessoas dizendo que havia crianças na casa, até um bebê recém nascido, mas depois ficamos sabendo que não tinha mais ninguém na casa. Como a familia não tinha onde ficar, uma pessoa ofereceu sua garagem para eles se instalarem provisoriamente. No outro dia os procurei para ajudá-los. Silvio, o pai da Ana, disse que ela e Adriana, a esposa, estavam no hospital por causa da fumaça. Então falei para ele que eu iria fazer uma campanha on line para arrecadar roupas, alimentação, dinheiro para pagar o aluguel de uma casa. No outro dia fui ao hospital para ver mãe e filha. Logo que eu cheguei, Adriana me colocou Ana nos meus braços, nesse momento eu já me apaixonei por ela, precisando de amparo, de ser acolhida, com 2 ou 3 dias de vida. Foi quando chegou a drª e disse que ela estava de alta hospitalar, então para onde ela iria? Então levamos ela para a garagem onde estava sua família. Só que a dona da casa que tinha emprestado a garagem iria precisar que eles desocupassem o local, então iniciei uma campanha no facebook para conseguir dinheiro para tentar alugar uma casa, e todo muito colaborou. Depois outra pessoa pagou mais dois meses de aluguel. eles se instalaram, então nesta casa e durante o dia eu trazia o bebê para minha casa para cuidar e levava à noite. 

Hoje Rosimere tem apenas lembranças:
fotos, roupas e brinquedos de
Ana Carolina
 Adriana me convidou para ser madrinha. Depois de alguns dias a Adriana me disse que não tinha condições de cuidar do bebê, que o Conselho Tutelar estava cuidando ela, que já tinham tirado outras duas filhas dela, e que iria deixar a  Ana Carolina para mim cuidar porque confiava em mim e que sabia que iria poder ver a criança sempre. Daí eu me realizei, vou cuidar do bebê para ela. Com dois meses me denunciaram para o Conselho Tutelar, que eu estava ilegal. Certo dia o Conselho me visitou, eles foram muito atenciosos e educados e me informaram que assim eu não poderia ficar, então eu entrei com um pedido de guarda. Nesse meio tempo, mais uma denúncia e então tiraram ela de mim e a levaram para o Lar de Meninas. Tiraram ela do meu amor, do meu carinho que era só para ela, eu montei quarto, comprei roupas, ainda tem roupas no pacote e calçados na caixa".  "Não é justo tirar uma criança da mãe, ela estava com o umbigo ainda quando eu cuidei dela. Era eu que estava com ela quando deu dor de barriga, dor de ouvido, foi eu que levei ela no médico, que levei para as primeiras vacinas e agora querem dizer que eu não sou a mãe!" Rosimere tem uma audiência dia 27 deste mês pela guarda de Ana Carolina e falou que vai lutar até conseguir, nem que isso leve tempo, não importa quantas dificuldades apareçam. Na quarta-feira  (1°), uma caminhada foi realizada como forma de protesto. Os manifestantes se reuniram na Praça Rui Favalli Bastide (Praça do Chafariz) e se deslocaram pela Av. Barão do Upacarai, empunhando cartazes e faixas e seguiram até a praça central.

Silvio e Adriana - pais biológicos de
Ana Carolina
 Conversamos igualmente com os pais biológicos de Ana Carolina, que reiteraram as afirmações de Rosimere. Adriana e Silvio, que hoje estão desempregados, falaram que estão enfrentando bastante dificuldades e este foi um dos motivos pelo qual pediram que Rosimere ficasse responsàvel pela criação de sua filha recém nascida. Eles contaram que perderam tudo no incêndio e ficaram somente com a roupa do corpo, literalmente. Recém conseguiram fazer os documentos novos, mas hoje, dia 4, vence o último mês de aluguel que estava pago e eles não sabem como vão fazer. Atualmente eles moram nesta casa alugada com mais três filhos. Sobre a denúncia feita de que Rosimere estaria irregular, Adriana e Silvio afirmaram não ter partido deles, pelo contrário, eles gostariam que neste momento a criança ficasse com ela. Rosimere organizou até um abaixo assinado onde espera que o clamor popular pese em futuras decisões.

Juiz Alexandre Del Gaudio Fonseca
 Conversamos com o dr. Alexandre Del Gaudio Fonseca, juiz de Direito da Vara da Infância e da Juventude. Segundo o magistrado, particularidades do caso de Ana Carolina não podem ser discutidas, porque por enquanto ele corre em segredo de justiça, mas genericamente, ele nos informou, de maneira genérica, como funcionam esses casos, que, de acordo com o juiz, são mais comuns do que se pensa. 

 Primeiramente, para se adotar uma criança, é necessário estar inscrito no cadastro nacional de adoção, que é o mecanismo que disciplina o processo para aqueles que  pretendem adotar uma criança. Fora desse mecanismo, todas as adoções são irregulares. Hoje em dia, qualquer outra forma de guarda de criança, configura-se uma adoção irregular. Antigamente, antes da criação do ECA - Estatuto da Criança e do Adolescente em 1990,  as adoções aconteciam de maneira informal, o que nem sempre era uma garantia de bons tratos para a criança. Hoje, o estado, através, do cadastro único, estabeleceu regras, onde estão incluídos estudos, pesquisas que garantem o bem estar da criança e do adolescente.

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